Na semana passada (26/10/2023), a Câmara dos Deputados deu um passo que reverberou pelo mercado financeiro: aprovou o projeto de lei que propõe a taxação de fundos offshore.
Esta decisão, parece ter um alcance limitado dentro da indústria de fundos no Brasil, segundo um levantamento realizado pela Anbima (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais).
Os dados atualizados até setembro revelam que, no universo de quase 60 mil fundos de investimento do país, apenas 769 declaram investir mais de 67% em ativos no exterior, conforme as novas regras propostas.
Juntos, estes fundos acumulam um patrimônio líquido de R$31,8 bilhões.
E, quando comparamos este montante com o patrimônio líquido total da indústria (cerca de R$ 8 trilhões), fica claro que os fundos offshore representam uma fração de apenas 0,3975%.
Por outro lado, os chamados fundos “onshore” somam cerca de R$750 bilhões. E isso não é à toa.
De acordo com cálculos do Ministério da Fazenda esses fundos abrigam recursos de aproximadamente 12 mil brasileiros e representam uma fatia considerável do mercado.
O foco da tributação proposta é direcionado principalmente às pessoas físicas com grande patrimônio, sobretudo os chamados “super-ricos“.
A ideia é que, embora os fundos offshore tenham uma participação modesta no cenário total, a aprovação da medida poderia influenciar positivamente a percepção dos investidores sobre a situação fiscal do Brasil.
Porém, mesmo com a perspectiva de que a taxação de fundos offshore afete apenas um segmento específico da indústria, permanece a questão: será que esta mudança legislativa trará o impacto desejado no humor dos investidores e na situação fiscal do país?
Taxação de fundos offshore e as contas públicas
A recente aprovação na Câmara dos Deputados sobre a taxação de fundos offshore foi recebida com elogios pelo ministro Fernando Haddad.
Para Haddad, o texto final do projeto, como aprovado pelos deputados, tem potencial para gerar uma arrecadação ainda maior do que a inicialmente prevista.
Isso se deve à inclusão de mecanismos que incentivam a adesão ao novo regime de tributação.
A expectativa inicial do Ministério da Fazenda era arrecadar cerca de R$7 bilhões com a taxação dos fundos offshore e outros R$13 bilhões com a tributação dos fundos exclusivos.
É importante ressaltar que essa medida faz parte de uma estratégia mais ampla do governo, que busca cumprir a promessa de zerar as contas públicas no próximo ano (2024).
Contudo, o impacto dessa notícia acabou sendo muito passageiro, principalmente após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmar que a meta fiscal para 2024 não precisaria necessariamente ser zero.
Isso foi o suficiente para causar uma mudança perceptível no apetite dos investidores.
Custo alto
Uma análise conduzida pela mesa de operações de mercado do Santander trouxe um esclarecimento sobre a situação atual da indústria de fundos no Brasil.
De acordo com este estudo, o alfa – uma métrica importante para avaliar o apetite ao risco – está no seu nível mais baixo desde a crise financeira de 2008.
Vale lembrar que, de acordo com essa métrica, quanto maior for o alfa, maior é o apetite por risco.
Ou seja, mesmo com uma possível melhora nos mercados locais, impulsionada pelo andamento da pauta política, a decisão dos investidores em fundos de reforçar suas posições teria um alto custo.
Isso reflete diretamente na redução significativa do risco relevante dentro desse segmento.
Além disso, o ambiente político e a percepção de uma interferência mais direta do governo no mercado financeiro têm impactado negativamente a disposição dos investidores locais e institucionais em assumir riscos.
Fora que a recente aprovação da proposta na Câmara também teve um preço político considerável para o Executivo.
“O texto progrediu coincidentemente ou não após o presidente Lula demitir a presidente da Caixa, Rita Serrano, para colocar um indicado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira, no lugar”, relembra Étore Sanchez, economista chefe da Ativa Investimentos.
Este avanço aconteceu ainda sob a sombra do retorno do deputado de uma viagem internacional.
Diante desse cenário, Sánchez alerta que a tramitação da matéria no Senado merece uma atenção especial por parte do mercado.
No final das contas, essa situação acaba revelando uma complexa interação entre o mercado financeiro, a política e a confiança dos investidores.
Mas, o que realmente muda com essa taxação de fundos offshore?
E a mudança real?
A medida aprovada na Câmara traz mudanças significativas na tributação de fundos e na taxação de fundos offshores.
Agora, haverá a incidência de uma alíquota de 15% do Imposto de Renda sobre a parcela anual dos rendimentos das aplicações.
Lembrando que, até então, a tributação ocorria apenas no momento da distribuição de recursos.
Além disso, a alíquota final para a regularização dos ativos nos fundos exclusivos foi ajustada para 8%, uma redução em relação aos 10% originalmente propostos.
Embora a proposta ainda precise ser analisada pelo Senado, ela já gerou bastante agitação no mercado financeiro e causou controvérsia entre especialistas em tributação.
Há preocupações sobre o risco de o assunto acabar sendo discutido na Justiça.
Para Étore Sanchez, da Ativa Investimentos, existem pontos críticos na questão, principalmente no que tange à tributação do estoque dos fundos exclusivos.
Segundo ele, isso fere o princípio de anterioridade. “A chance de judicialização é altíssima”, avalia Sanchez.